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sábado, 3 de maio de 2014

MERCADANTE: “O QUE MUSEU TEM A VER COM EDUCAÇÃO?”

Essa pergunta do ex-ministro da Educação e Cultura (MEC), Aloízio Mercadante, atual chefe da Casa Civil: “O que o museu tem a ver com educação?”


Enquanto se discute se a primazia deve caber à cultura clássica ou à cultura popular, o que não tem sentido, nossos espaços disponíveis são subutilizados. Os museus fecham aos domingos e feriados, por falta de porteiros e guias, que não trabalham em fins de semana. Não há verba para isso. Com esta orientação do ex-Ministro da Educação fica difícil criar uma consciência da importância da nossa cultura, no espírito das novas gerações.

O caminho para a solução passa necessariamente pela junção dessas duas vertentes, justificando a sigla MEC.

Educação e cultura são uma espécie de irmãos xifópagos. Um não pode viver sem o outro. O MEC passou décadas cuidando dessas vertentes. Com isso, inspirou a criação de Secretarias Estaduais de Educação e Cultura. Houve harmonia e resultados.
Quando o presidente Tancredo Neves, para atender a interesses políticos, resolveu desmembrar a Cultura da Educação, houve sérios prejuízos para a primeira delas, que passou a viver de migalhas no Orçamento da República.

Um nazista foi enfático ao se deparar com a palavra cultura: – “Quando a ouço, tenho vontade de puxar o revólver e sair atirando”. Tornou-se clássico o desprezo totalitário pelo conceito de cultura e os seus naturais desdobramentos.

Se o cinema é atendido, não sobra nada para o teatro. Se há recurso para o balé, falta para a música. E o patrimônio histórico fica abandonado, como se o país desprezasse a sua memória. Não se faz nada mais por Ouro Preto, nem pelo centro histórico do Rio de Janeiro, muito menos pela pequena cidade de Marechal Floriano, em Alagoas. A razão? Absoluta falta de verbas (ou de mentalidade).

Só há recursos para pagar o funcionalismo, mas não há projetos em andamento. A Biblioteca Nacional precisa urgentemente de obras. O Museu Nacional de Belas Artes tem 9 mil quadros em porões. Milhões de brasileiros jamais tiveram acesso a uma dessas preciosidades.

De uma população de 200 milhões de brasileiros, quantos se encontram à margem do processo cultural, de que a educação faz parte?

Seguramente, 40% desse total não têm acesso aos bens culturais. Não é difícil provar essa verdade, pois dados oficiais confessam a existência hoje de 28 milhões de analfabetos, a que se pode agregar 34 milhões de semialfabetizados, compondo um quadro inacreditável de marginalizados culturais (62 milhões de brasileiros).

Como aplicar os paradigmas de cidadania a esse outro Brasil que não tem acesso à escola, aos museus, às bibliotecas e a todos os demais equipamentos culturais que marcam uma sociedade desenvolvida?

Hoje, cultura merece o respeito das nações pós-industrializadas. É pensada, como ocorre nos Estados Unidos, até como próspero negócio, onde circulam bilhões de dólares. Como seria natural, no mundo cultural também se busca o aumento da eficiência, o banimento do amadorismo, enfim a qualidade total. Para que isso ocorra, são necessários dois pré-requisitos essenciais: a sensibilização humana e a capacitação técnica.

Os especialistas em marketing cultural proclamam que os empresários da área têm essas duas qualificações, o que infelizmente nem sempre é verdadeiro. Há filmes abaixo da crítica e peças teatrais que jamais deveriam ter sido montadas. Essas obras “geniais” muitas vezes contam com expressivos recursos de patrocínio oficial, que costuma premiar os filhotes costumeiros. O curioso é que se reclama do montante de recursos disponíveis para o financiamento de tais produções.

Como não existe uma política cultural digna do nome, a premiação é feita por critérios estritamente pessoais, muitas vezes aquinhoando elementos conhecidos das “panelas” que se estabeleceram para disputar esse tipo de paternalismo.

Quando se trata de pensar educação e cultura, em nosso país, temos razões de sobra para perder o sono. O governo Federal não tem planos concretos para a área cultural, como não poderia deixar de ser, tendo ele a biografia de um permanente comprometimento no campo das ideias: cultura zero. Com Ministério ou Secretaria será possível criar fatos novos na área, a começar pelo desmantelamento da influência dos produtos culturais de gabinete. Não se deseja paternalismo, nem assistencialismo, nem protecionismo.

MEC: 83 anos

A história do MEC teve início no dia 14 de novembro de 1930 quando nasceu o Ministério dos Negócios da Educação e Saúde Pública. Em 2013, portanto comemora-se o 83º aniversário da pasta que institucionalizou o trato das questões educacionais, antes cuidados pelo Ministério dos Negócios Interiores.

De 1930 a 1946 foi Ministério da Educação e Saúde. De 1946 a 1985 foi Ministério da Educação e Cultura (MEC), com a convicção de que lidávamos com processo cultural, de que a educação faz parte.

Quando o presidente Tancredo Neves, para atender a interesses políticos, resolveu desmembrar a Cultura da Educação, houve sérios prejuízos para a primeira delas, que passou a viver de migalhas no Orçamento da República.

No ano de 1985, por iniciativa de José Sarney, nasceu a pasta da Cultura, que passou a ter vida própria e recursos mais apreciáveis em função de Leis de incentivo fiscal (Lei Sarney e Lei Rouanet).

O nome de Ministério da Educação e do Desporto nasceu em 1992, com o retorno do setor esportivo ao âmbito da educação.

O MEC tem sido marcado por uma intensa descontinuidade. Houve ministros, como é o caso do professor Gama e Silva, com apenas nove dias no cargo. Em compensação, Gustavo Capanema ficou 11 anos, o que pode ser explicado pelo fato de ter pertencido ao governo Vargas, caracterizado por um período de 15 anos (somente no período republicano, passaram pelo Ministério da Educação aproximadamente 40 ministros, o que é inaceitável). E, agora o ex-Ministro Aloízio Mercadante – uma frustração.

A educação brasileira é um dos tristes marcos do período republicano e nos dois últimos governos. E talvez venha a repetir o mesmo ciclo de frustrações no atual governo.

O Japão, a Coreia, a China, a Alemanha questiona, pois, o seu modelo educacional. Enquanto isso, no Brasil, os Ministros da Educação saem felizes do Governo porque deram merenda às crianças carentes.

Democratização do ensino não é baixar o nível de ensino na escola (igualando a todos na ignorância), mas levar o bom ensino a todos, para que cada um chegue aonde quer e pode chegar.


(*) é professor universitário, jornalista e escritor 
fonte:http://www.diariodopoder.com.br/artigos/aloizio-mercadante-o-que-o-museu-tem-a-ver-com-educacao/