CONCLUSÃO
A riqueza de detalhes dos filmes da
Mazzaropi torna complexa a análise de sua obra. A prática da dominação é
recorrente em suas obras, por vezes incorporada a um novo contexto. Os
conflitos tomam novos parâmetros, o caipira muitas vezes não é o mesmo ingênuo
passível de enganação, porém, as tentativas persistem mesmo que os meios pelos
quais a elite busca a manutenção do poder se renovem.
O processo pelo qual o caipira e sua
cultura foram submetidos adquire um importante instrumento para sua compreensão
com a análise da filmografia de Mazzaropi. As obras podem ser reordenadas a fim
de definir uma cronologia linear, que tem início em “Casinha Pequenina” e
término em “Meu Japão brasileiro”.
Ao contrapor as obras dessa forma é
possível observar claramente nos filmes de temática caipira, os processos de
auge e declínio da cultura caipira, assim como o resultado do impacto do
processo de modernização do campo. Como observado em “Meu Japão brasileiro”,
obra que apresenta o caipira em um estágio mais aculturado, os elementos da
cultura caipira ainda podem ser observados, mesmo com a hegemonia dos elementos
urbanos. Neste sentido, a observação das obras como uma cronologia, revela
traços do processo como um todo.
A utilização da obra cinematográfica de
Mazzaropi como fonte documental revela o potencial da representação fílmica
para a disciplina histórica. A abordagem do filme como documento apresenta
contribuições para algumas abordagens. Uma vez determinada a relevância do
filme enquanto documento, foi possível projetar a análise além da relação
dicotômica rural/urbano e definir alguns parâmetros de estudo referentes à
linguagem e ao gênero.
A partir destes levantamentos é
possível afirmar que a obra de Mazzaropi não esgota as possibilidades de
análise e apresenta elementos convergentes a diferentes análises culturais,
como o corpo, imagens, objetos e produções culturais materiais e imateriais.
Dessa forma a obra de Mazzaropi torna-se determinante como fonte de
conhecimento histórico de tal relevância que necessita ser considerada e
explorada a fim de revelar novas contribuições para a disciplina.
O estudo da obra de Mazzaropi obriga o
historiador a incorporar o olhar antropológico, os filmes inserem o observador
em uma realidade na qual é necessário o profundo conhecimento da
cultura para distinguir a riqueza de elementos apresentada do que viria a representar
algum tipo de influência externa advinda da mistura entre a realidade do
produtor (Mazzaropi) e o recorte que buscava retratar, por vezes tornado-se
irrelevante tal separação devido a incorporação de um novo significado ao que
era retratado.
A obra de Mazzaropi supera a visão por
vezes apresentada, que busca relacioná-la ao ideal progressista de sua época de
produção. Mesmo as produções revelando elementos do discurso dominante de sua
época, a análise em primeira instância traz importantes representações do
caipira e de sua realidade.
Traços da sociabilidade, das relações
de trabalho, das representações culturais e da resposta do caipira ao avanço da
urbanização podem ser observados. Contudo, a análise também contribui para o
entendimento do processo histórico pelo qual o Brasil passou. Neste sentido
estigmatizar a obra de Mazzaropi ao determinar sua relação com o processo no
qual se insere é desconsiderar sua efetiva contribuição.
Inserido em um novo espaço social e
obrigado a adaptar sua expressão cultural, o público de Mazzaropi é formado
pelo caipira que abandonou sua ligação com a terra e adotou o modelo dominante.
Ao aderir ao novo contexto, o homem do campo alterou suas formas de produção e
consumo. O trabalho assalariado de certa forma substituiu o mutirão e alterou
as formas de sociabilidade do homem do campo. A circulação de moeda corresponde
à gradual diminuição da produção para subsistência e das trocas. A cultura
baseada na oralidade é influenciada pela campanha de alfabetização, necessária
para a empregabilidade do homem do campo nas indústrias.
E a relação do caipira com o tempo foi
alterada e enquadrada no modelo de carga horária. O homem do campo,
caipira aculturado era parte fundamental do público de Mazzaropi. Reconhecia na
produção sua cultura e idealizava um passado que de certa forma se apresentava
como uma alternativa distante ao contexto no qual estava inserido. A
idealização do passado é um fato recorrente entre as classes dominadas,
com o aponta Thompson (1989). Neste sentido, o cinema se apresenta como
mecanismo que propicia este fato. O passado não está contido desta vez apenas
na memória coletiva, mas pode ser acessado também por meio dos filmes.
Mazzaropi iniciou sua carreira muito
cedo em companhias circenses. Construiu seu caipira da convivência com o avô em
Taubaté-SP e logo já realizava imitações.
Teve toda sua vida atrelada à arte e se
dedicou a construir a indústria cinematográfica brasileira.
Conquistou plateias por apresentar nas telas o que seu público,
adaptado ao novo modo de vida (urbano), havia vivenciado ou idealizava por meio
de uma memória coletiva.
O cineasta proporcionava momentos
catárticos aos espectadores devido às recorrentes vitórias de seu Jeca
contra aqueles que buscavam incessantemente valer-se da dita inferioridade
do caipira e sua cultura e de certa forma valorizou a produção cinematográfica
brasileira ao apresentar em sua produção um modelo cultural tradicional e
conservador.
Alex Sandro Fonseca
Moacir José dos Santos
Bolsista do Programa de Iniciação Científica do Centro Universitário Módulo.
Doutor em História pela Universidade Estadual Paulista "Julio de Mesquita
Filho"- câmpus de Assis. Professor do Centro Universitário Módulo e
Professor-Pesquisador do Programa de Mestrado em Planejamento e
Desenvolvimento Regional da Universidade de Taubaté
fonte: @edisonmariotti #edisonmariotti
produção bibliográfica de Giselle Gubernikoff
Giselle Gubernikoff
Possui o 1o. Ano de Jornalismo pela Fundação Armando Álvares Penteado (1971), graduação em Artes/Cinema pela Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo (1976), mestre em Artes/ Cinema pela Universidade de São Paulo (1985), doutora em Artes/ Cinema pela Universidade de São Paulo (1992), livre-docência em Ciências da Comunicação/ Publicidade pela Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo(2000). Professora Titular pela ECA USP em Artes Visuais/Multimídia e Intermídia na especialização Fotografia, Cinema e Vídeo (2002). Atualmente é professora titular do Departamento de Artes Visuais da Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo. Tem experiência na área de Audiovisual/ Cinema, com ênfase em Produção, Roteiro e Direção Cinematográficos, atuando principalmente nos seguintes temas: mídias digitais e novas tecnologias de comunicação, linguagem cinematográfica, produção audiovisual, cinema publicitário, representação feminina, cinema brasileiro, cinema e consciência cultural e museologia e mídias digitais.
(Texto informado pelo autor)
(Texto informado pelo autor)
artigo completo:
http://publicacoes.fatea.br/index.php/angulo/article/viewFile/830/595
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