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domingo, 3 de julho de 2011

Em honra ao aniversário, museus de todo o país prepararam exposições para explicar a "gloriosa história"...


PC chinês faz 90 anos e dá ao mundo a sua visão da nova superpotência 




O Partido Comunista da China comemora hoje seu 90º aniversário com toda a pompa e cerimônia condizentes com os governantes incontestes de uma superpotência em ascensão. Mas, por trás de toda a retórica congratulatória sobre rejuvenescimento nacional, há uma preocupante visão que os chineses têm da história e das relações internacionais.
Em honra ao aniversário, museus de todo o país prepararam exposições para explicar a "gloriosa história" do partido para as massas, e cada uma delas é aberta do mesmo jeito: "Desde que os invasores britânicos começaram a guerra do ópio, em 1840, as potências capitalistas ocidentais vieram uma após outra para a China, e assim a China foi reduzida a uma sociedade semicolonial e semifeudal", diz a introdução da exposição no local, em Xangai, onde o partido foi fundado em 1921.
Os visitantes dessas exposições ou os leitores dos livros de história chineses ficarão ultrajados com a perversidade dos imperialistas ocidentais e inspirados pelo triunfo heroico do Partido Comunista, por ele ter finalmente livrado o país da opressão dos invasores estrangeiros. Mas em todas as exposições e nos livros de história oficiais mal se fala da cruel Revolução Cultural, que durou uma década, ou do desastre econômico do Grande Salto para Frente, que segundo se estima provocaram a morte de 45 milhões de pessoas.
Essas e outras omissões evidentes, e a fixação nos crimes dos agressores estrangeiros vêm sendo descritas por alguns acadêmicos chineses como algo parecido com nutrir os jovens da nação com "leite de loba". O relato da humilhação nacional marca até hoje as relações da China com o Ocidente e, embora isso seja visto pelo Partido como uma maneira de desviar as críticas contra si mesmo, é algo que também poderá ricochetear contra os líderes chineses se eles forem percebidos como brandos demais com os estrangeiros. Durante sua visita ao Reino Unido nesta semana, Wen Jiabao, o primeiro-ministro chinês, foi educado demais para mencionar diretamente a guerra do ópio.
Mas para qualquer um com um conhecimento rudimentar da história oficial da China, a mensagem foi clara quando ele censurou o Reino Unido por "apontar o dedo" e "reprovar" Pequim por seu histórico nos direitos humanos. Em uma entrevista conjunta à imprensa com David Cameron, o primeiro-ministro britânico, ele falou dos 5 mil anos de história da China, em que o país já foi exposto a sofrimentos imensuráveis (nas mãos das potências imperiais lideradas pelo Reino Unido, na implicação não dita). "Isso ensinou os chineses a nunca falar com os outros de uma maneira reprovadora, e sim a respeitar as nações na base da igualdade", disse Wen.
Os altos funcionários chineses que estiveram em Londres chegaram até a dizer que a preocupação do Reino Unido com as violações dos direitos humanos na China significa que agora o país é visto menos favoravelmente em Pequim que a Alemanha, a França, a Itália e a Espanha.
É difícil levar a sério tais ameaças quando se olha para o histórico recente do governo chinês de colocar as relações com vários países num congelamento diplomático. A Alemanha e a França vêm sendo vistas recentemente como as ex-potências imperialistas mais odiadas, depois que seus líderes receberam o Dalai Lama ou criticaram as sanções impostas ao Tibete.
A Austrália e os Estados Unidos também vêm sendo acusados por Pequim de "magoar os sentimentos de 1,3 bilhão de chineses" e o Japão, que invadiu a China na década de 1930, é perpetuamente culpado do mesmo. O problema em estimular o nacionalismo xenófobo é que você precisa continuar alimentando a fogueira com novas humilhações e, na medida em que a China fica mais poderosa e assertiva no mundo, a eterna sensação de humilhação dos chineses poderá levar a equívocos diplomáticos perigosos de todos os lados.
Pequim precisa avaliar com atenção a visão que tem da história, mas diplomatas, políticos e cidadãos comuns do Ocidente também devem entender o prisma histórico e político através do qual a China vê o mundo, para que eles possam lidar melhor com sua ascensão.
Qualquer estudante chinês provavelmente consegue mencionar datas e detalhes sobre a guerra do ópio e os posteriores "tratados traiçoeiros e desiguais" que permitiram ao Ocidente, liderado pelo Reino Unido, abocanhar pedaços do território chinês.
Mas a maioria dos estudantes britânicos e de outras partes do mundo tem apenas uma vaga ideia dessa história tumultuada.
Wen mencionou esse desequilíbrio após assistir a uma exibição de "Hamlet", uma de suas peças favoritas, em Stratford-upon-Avon: "Ela me fez imaginar se os amigos estrangeiros têm um interesse tão entusiasmado pela história e o teatro da China, quanto eu tenho por Shakespeare".
Fonte: Valor Econômico

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