Condensando uma natureza solar e
precária, o trabalho de Adriano Costa é um dos destaques da mostra Sob o
Mesmo Sol: Arte da América Latina Hoje, inaugurada ontem em três
espaços do Guggenheim nova iorquino. Com curadoria do mexicano Pablo
León de La Barra, a exposição, formada por obras de 40 criadores de 15
países, será apresentada entre abril e junho de 2015 no Museu de Arte
Moderna de São Paulo - e depois seguirá para o Museo Jumex, na Cidade do
México.
"Já não podemos falar de uma só America
Latina, a representação regional não mais funciona", afirma Pablo de La
Barra. "Mesmo assim, há uma série de coincidências, paralelismos,
conexões históricas e contemporâneas nas sensibilidades que existem
abaixo do mesmo sol", continua o curador. Sobre o título da exibição, o
mexicano ainda lembra que as colônias espanholas e portuguesa eram
“impérios onde o sol nunca se punha". "É presente nos trabalhos dos
artistas a maneira como eles respondem a essas histórias."
Jogar com os clichês, expressa La Barra,
foi uma estratégia para transformar conceitos sobre latino-americanos. A
instalação Ya Veremos Como Todo Reverbera (2012), do mexicano Carlos
Amorales, é uma das primeiras peças da exposição, um móbile de pratos de
bateria suspensos a serem tocados pelo público. Alguns visitantes
extravasam com a obra, outros participam mais timidamente do trabalho -
existe algum humor em trechos da exposição, derivados da raiz
crítica-conceitual, um caráter sensorial e sutilezas potentes como nos
cartões-postais da mineira Rivane Neuenschwander em Mapa-Múndi BR
(2007), sequência de imagens feitas no interior do Brasil.
Mais ainda, ativismo político, a ideia
de "tropical" como estética "divergente da Europa e América do Norte", a
abstração e a participação ativa do visitante são segmentos que vão
costurando a mostra. Deste último nicho, o curador exemplifica sua
escolha pela instalação Cartazes para o Museu do Homem do Nordeste, que o
alagoano residente no Recife Jonathas de Andrade exibiu no ano passado
no Brasil com grande sucesso. O espectador é convidado a rearranjar as
peças do trabalho, que trata de miscigenação e resgata conceito do
antropólogo Gilberto Freyre.
Do Brasil, Sob o Mesmo Sol, em cartaz
até outubro e que também apresenta programação de filmes, coloca ainda a
presença de Paulo Bruscky, Tamar Guimarães, Erika Verzutti, Carla
Zaccagnini - as participações do sueco Runo Lagomarsino (em Contra
Tempos, ele registrou, na marquise do Parque do Ibirapuera, rachaduras
na forma do mapa da América Latina, numa reflexão sobre a modernidade) e
da francesa Dominique González-Foerster podem ser consideradas
brasileiras também, já que os artistas vivem em São Paulo e Rio,
respectivamente, há tempos.
De outros países latinos, há trabalhos,
por exemplo, das argentinas Marta Minujín e Amalia Pica, dos mexicanos
Gabriel Orozco e Damian Ortega, dos cubanos Wilfredo Prieto e Tania
Bruguera, do venezuelano Javier Téllez e do chileno Alfredo Jaar. A
seleção preza, afinal, a mistura de criadores de diferentes gerações.
Aquisição
A exposição de arte da América Latina
integra o projeto Guggenheim UBS Global Art Initiative, que já "mapeou",
em 2012, o Sul da Ásia com mostras que foram apresentadas em Nova York,
Cingapura e Hong Kong, e depois, em 2016, será dedicado ao Norte da
África e Oriente Médio. Mas, mais do que as exposições, o programa
promove a aquisição de todas as obras participantes para o acervo do
museu norte-americano.
Trabalhos de jovens entram, assim, para a
coleção da prestigiada instituição, como também os de criadores de
trajetórias exemplares nas décadas de 1960, 70 e 80. “Era muito
importante mostrar que há uma pré-história das práticas conceituais
contemporâneas”, afirmou Pablo Léon de La Barra. "Muitos dos artistas da
exposição haviam estado nos EUA trabalhando durante esses anos,
exilados de seus países por causa da situação ditatorial ou repressiva
dos governos."
"Em Nova York encontraram um solo fértil
para desenvolver seus trabalhos em diálogo com a cena artística do
momento", continuou o curador. Ele acredita que criadores como o chileno
Juan Downey" desapareceram desta história escrita desde os EUA". Mais
ainda, muitos deles foram bolsistas da família Guggenheim, como Luis
Camnitzer e Paulo Bruscky.
O pernambucano, por exemplo, participa
de Sob o Mesmo Sol com um de seus históricos anúncios publicados nos
classificados de jornais, feito em 1982, nos EUA, com Daniel Santiago. A
dupla solicitou a colaboração das pessoas com propostas para uma
composição de nuvens coloridas para o céu de Nova York. Era a "Air Art",
naquela época.
Depois da América Latina, o foco do
projeto Guggenheim UBS Map vai se voltar para a arte do Norte da África e
do Oriente Médio. As mostras derivadas da iniciativa ocorrerão a partir
de 2016, mas a região escolhida envolve um tema polêmico referente à
instituição americana, a construção bilionária de uma filial do museu na
ilha de Saadiyat, em Abu Dhabi.
Nos últimos anos, a obra, anunciada em
2006, com projeto do arquiteto Frank Gehry, vem recebendo duras
críticas. Artistas, como o libanês Walid Raad e os membros do grupo
Guerrilla Girls, têm sido expoentes recentes de protestos contra as
denúncias de violações de leis trabalhistas relativas ao projeto. “Todos
estão preocupados em trabalhar corretamente, não importa onde
estivermos", disse Richard Armstrong, diretor do Museu e Fundação
Solomon R. Guggenheim. "No caso de Abu Dabi, estamos trabalhando com o
governo no sentido de fazer mudanças nas leis de trabalho, estabelecendo
um novo modelo para a região", completou.
A itinerância da mostra Sob o Mesmo Sol:
Arte da América Latina em abril de 2015 para o Museu de Arte Moderna
(MAM) de São Paulo é a primeira ação nesse sentido. "É uma cidade de
grande público e sabemos que teremos profissionais importantes nas
aberturas da exposições, possíveis futuros parceiros”, falou Armstrong.
Avesso a falar do orçamento do projeto Guggenheim UBS Map, que inclui a
compra das obras expostas - da Ásia, foram 26; de arte latino-americana,
50 -, ele declara que a maior parte das despesas da mostra no MAM será
do patrocinador americano.
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