CHONGQING, China – Desde o início de seu período como comandante da missão americana na China durante a Segunda Guerra Mundial, o general Joseph W. Stilwell demonstrou um carinho contraditório pela abafada capital do sudoeste chinês, onde ficaria durante muitos anos.
“Chungking não é tão ruim quando o sol está brilhando”, afirmou sem titubear em seu diário, utilizando a grafia da época. Mas sua tolerância pela cidade isolada e cheia de refugiados escondida às margens do Rio Yangtze não durou muito tempo.
Um ano depois, escreveu um poema em cinco estrofes que dizia: “O lixo é rico, e apodrece nas valas. As carroças de mel espalham poluição.”
Quando Stilwell foi chamado de volta aos EUA no outono de 1944, reclamou que Washington era “uma pilha de estrume tão grande quanto Chungking”.
Ainda assim, sua visão pouco delicada de Chongqing, que se converteu em uma metrópole de 30 milhões de habitantes, não impediu que a cidade admirasse e estudasse os feitos do herói militar americano, que foi enviado pelo presidente Franklin D. Roosevelt para ajudar os chineses a enfrentar os japoneses.
Um museu dedicado à memória de Stilwell foi aberto há mais de 20 anos na casa de pedra e telhas retas, com um jardim de palmeiras, onde o general viveu e trabalhou. Pesquisadores de Chongqing afirmam que quando William J. Perry, que na época era secretário da Defesa dos EUA, veio para a inauguração do museu em 1994, seu avião foi a primeira aeronave norte-americana a descer na cidade desde a vitória dos comunistas em 1949.
Em um sinal de respeito oficial por Stilwell, a prefeitura de Chongqing é responsável pelo museu.
Busto do general Joseph W. Stilwell na cidade de Chongqing,
na China Foto: ADAM DEAN / NYT
na China Foto: ADAM DEAN / NYT
Jane Perlez, The New York Times - OGlobo
Uma das maiores batalhas de personalidade da Segunda Guerra foi travada na cidade, quando dois homens teimosos e hostis, Stilwell e Chiang Kai-shek, o líder nacionalista, disputavam a afeição do presidente dos EUA, embora devessem agir como aliados. Stilwell se referia abertamente a Chiang como “Amendoim” e criticava sua corrupção, queixando-se do fato de deixar seus homens famintos nas ruas de Chongqing.
Os móveis de madeira escura, um mapa amarelado mostrando a região na parede da sala de reuniões e uma mesa de jantar simples dão uma boa ideia do que acontecia nessas salas modestas. Outros toques – uma máquina de escrever Remington de ferro acinzentado, uma estante de livros com portas de vidro atrás da mesa do general e uma cama de madeira – são todas do mesmo período, mas não pertenciam ao general, de acordo com seu neto, John Easterbrook.
As fotos nas paredes refletem as intrigas de uma cidade que não serviu apenas de abrigo para o exército e membros do governo norte-americano que atuavam ao lado de Chiang, mas que também abrigava um pequeno grupo de comunistas liderados por Zhou Enlai, que viria a se tornar o primeiro premiê da República Popular da China, e que não ficava muito longe da casa de Stilwell.
Segundo Theodore H. White, correspondente da revista “Time” na China, era como se os executivos mais capazes e devotados de Nova York, Boston e Washington tivessem saído de casa e criado um foco de resistência contra o inimigo no meio dos Apalaches.
As imagens mais impressionantes do museu Stilwell são fotos em preto e branco dos generais de cara amarrada, Stilwell e Chiang, que capturam seu relacionamento distante. Ambos aparecem virados para frente, magérrimos e com olhar fixo, com a senhora Chiang Kai-shek impecavelmente vestida entre os dois, como uma intermediária chique – embora nem sempre confiável, do ponto de vista dos EUA.
Depois de chegar ao poder, o Partido Comunista Chinês se negou a reconhecer a ajuda que os EUA haviam dado à China na derrota contra os japoneses, uma reação ao apoio americano a Chiang durante a guerra civil. Contudo, essa atitude mudou nos anos 90, e agora o papel dos EUA se tornou parte da versão padronizada da narrativa da guerra.
A visão negativa que Stilwell tinha em relação a Chiang, que perdeu para os comunistas e fugiu para Taiwan em 1949, ajudou a torná-lo um herói na China.
Nos documentos de Stilwell, atualmente abrigados no Instituto Hoover, da Universidade de Stanford, o general se refere ao programa comunista como: “Redução de impostos, alugueis e taxa de juros. Aumento da produção e do padrão de vida”. O governo de Chiang, segundo ele, era assolado pela “ganância, corrupção, favoritismo, mais impostos e moeda arruinada. Um desrespeito terrível à vida e a todos os direitos humanos”.
— Stilwell não estava nada contente com os soldados do Kuomintang e a situação da guerra — afirmou Zhou Yong, diretor do Centro de Pesquisa Chongqing da Grande Retaguarda Durante a Guerra Contra o Japão, referindo-se ao Partido Nacionalista Chinês.
— Mas essa era a realidade da China na época — afirmou Zhou, que foi aos Estados Unidos e a Taiwan para pesquisar sobre Chongqing na época da guerra. — (Stiwell) havia encontrado uma nova força para vencer a guerra, e essa nova força era o Partido Comunista.
Stilwell, segundo ele, queria que os comunistas sob o comando de Mao Zedong recebessem uma parcela proporcional à de Chiang dos equipamentos militares enviados pelos EUA. Essa divisão igualitária nunca aconteceu: Chiang ganhou do americano em quem nunca havia confiado, convencendo Roosevelt a levar o general de volta para casa.
Entre os estudiosos chineses, a atitude incansável contra Chiang que prevaleceu durante os primeiros anos do governo comunista já perdeu força, e agora ele e seus homens recebem o crédito merecido por impedir o avanço das tropas japonesas.
— Houve uma transformação do estudo chinês dessa parte da história. Antes, os especialistas só citavam os Kuomintang para criticá-los. Mas agora conseguimos vê-los de forma mais objetiva — afirmou Tan Gang, professor associado na Universidade do Sudoeste em Chongqing.
Era compreensível, de acordo com Tan, que Chiang odiasse Stilwell e trabalhasse para prejudicá-lo:
— Stilwell costumava criticar Chiang Kai-shek publicamente e de forma bastante agressiva. Isso envergonhava o líder – e é por isso que ele não gostava do americano.”
Embora o general fosse conhecido como “Vinegar Joe” (Zé Vinagre), e suas palavras tenham deixado uma imagem indelével de um chefe agressivo, seus diários eram basicamente uma tentativa de se livrar da pressão, afirmou Easterbrook em uma entrevista por telefone da sua casa nos arredores de San Jose, na Califórnia. O general provavelmente gostaria de ser lembrado como um bravo defensor dos soldados chineses, afirmou seu neto.
Desde o início de sua estadia na cidade, escreveu Stilwell, “os soldados eram um exemplo da grandeza do povo chinês, com espírito indomável, lealdade sem reclamações, honestidade de propósito e perseverança incansável”.
Fonte: @edisonmariotti #edisonmariotti
http://extra.globo.com/noticias/mundo/china-mantem-museu-em-homenagem-general-americano-18829686.html#ixzz42Ws6VVvy
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