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segunda-feira, 22 de agosto de 2011

Artistas jovens e veteranos terão obras apresentadas em mostra no Inhotim


Marilá Dardot. Imagem: Jackson Romanelli/ EM/ D.A.Press
Jackson Romanelli/ EM/ D.A.Press

Há cinco anos surgia, em Brumadinho, Região Metropolitana de Belo Horizonte, um museu que ficaria conhecido quase instantaneamente: o Centro de Arte Contemporânea Inhotim, hoje Instituto Inhotim. Dois anos antes, quando o local era visitado apenas por convidados, o assombro com o projeto já era grande. Foi a abertura ao público e visão de galpões em meio a jardins monumentais, abrigando obras para lá de arrojadas, que impactou o público e fez a fama, inclusive internacional, do espaço. Nascia instituição de referência no que se refere à arte experimental, que celebrava ainda a natureza e a ecologia.

Quem se encanta com a beleza, rigor e elegância do Inhotim nem imagina o que é ver áreas do local tornadas um canteiro de construção, com pedreiros, marceneiros, eletricistas, paisagistas e equipes do museu em meio a terrenos poeirentos, estruturas incompletas de prédios e obra de arte empacotadas. Todos construindo exposições e até as obras a serem exibidas. O ritmo agitado tem motivo: em outubro vão ser apresentadas nove obras – sendo que cinco delas já podem ser visitadas pelo público.
Contexto que faz com que artistas, em visita aos locais onde seus trabalhos vão ser instalados, fiquem parecendo operários e vice-versa. Há cenas insólitas. Depois de percorrer trilha em meio à mata chega-se à cerâmica, alojada num simpático galpão, onde jovens e senhoras concentradas estão fazendo letras com barro. Há pilhas delas em meio a outros utensílios. As peças, vasos com formas de letras, são para obra da mineira Marilá Dardot, de 38 anos, que vive e trabalha em São Paulo, cujo título é A origem da obra de arte.
A obra de Marilá Dardot vai oferecer ao público, 1,5 mil letras-vasos, sementes e equipamentos de jardinagem. As pessoas poderão usar todo o material e espalhar os vasos no gramado, criando palavras e frases. “É biblioteca em potencial”, brinca a artista, referindo-se à obra e ao gramado. “Meu trabalho é sobre a linguagem, que vejo como instrumento entre nós e o mundo. A linguagem é o instrumento mais simples para pensar e transformar o mundo”, observa. Marilá explica que a obra é “conversa irresponsável” com texto do filósofo Martin Heiddeger (1886-1976), também chamado A origem da obra de arte.

A primeira versão da obra, de 2001, foi apresentada no Museu de Arte da Pampulha. Lá, devido ao curto tempo da exposição, o trabalho foi realizado com plantas que cresciam rápido. Em Inhotim foi possível incorporar outras espécies, o que permitirá observar as transformações das plantas de acordo com as estações. “Se na Pampulha só se via o nascimento, o surgimento da vida, em Inhotim se verá também a morte, o replantar, o renascer. E a obra ecoa na paisagem à volta”, observa a artista. Outro atrativo de Brumadinho, para ela, é a oportunidade de contato com público amplo e muito variado.

Confronto
A exposição de outubro traz trabalho de outra artista mineira que está sob holofotes de muito prestígio: Cinthia Marcelle, de 27 anos. É dela o gigantesco quadro negro com escritos apagados, tendo ao chão pó de giz, que marcou presença na última Bienal de São Paulo. A artista vem ganhando prêmios nacionais e internacionais. Entre eles o da primeira edição da Future Generation Prize, em 2010, da Victor Pinchuk Foundation, de Kiev (Ucrânia), patrocinado pelo mecenas e colecionador que dá nome à instituição – e que participou com Bernardo Paz, o fundador de Inhotim, na mesa Arte e filantropia no Fórum Econômico de Davos, na Suíça.

Cinthia Marcelle vai mostrar o vídeo Confronto, apresentando malabaristas de sinal de trânsito que usam peças com fogo, multiplicando-se até formar barreira humana diante dos veículos. É ação criada para vídeo, que se desenvolve num crescente, inclusive de tensão, ampliado pelo som. “O confronto muda a ordem das coisas”, observa. Ela explica que seus trabalhos estão no limite entre a performance e a intervenção urbana. “São imagens sintéticas, que propõem mais perguntas que respostas”, afirma.

Os próximos compromissos da artista são mostras em Estocolmo e Kiev, no Pinchuk Art Center. A tranquilidade com que ela viaja às vésperas da exposição (é a época em que artistas costumam ficar muito tensos) revela outro aspecto do funcionamento do Inhotim: o cuidado com a apresentação de cada obra. Curadoria e Cinthia discutiram onde localizar o trabalho – vai ficar em galeria com artistas cujas obras trabalham a tensão.
“Foi um privilégio ter trabalho escolhido para fortalecer o contexto de obras fortes”, observa Cinthia. “Inhotim dialoga muito de perto com o artista”, elogia. Os trabalhos dela podem ser vistos no endereço www.vimeo.com/cimarcelle.
A mostra da Galeria Fonte vai ser oficialmente aberta em outubro, mas o público já pode conferir alguns trabalhos em exposição. O espaço vai reunir obras do chileno Eugenio Dittborn, dos alemães Lothar Baumgartgem e Isa Genzken, da norte-americana Susan Hiller e do brasileiro Marepe. A tônica é a relação entre natureza e cultura, mas de ângulos muito singulares. É o olhar da nova geração, sejam os artistas jovens ou veteranos. Até porque os últimos, turma com idade entre 60 e 70 anos, tem obra respeitada, mas ainda pouco conhecida do público. Só agora começam a ser reverenciados.

Eugenio Dittborn, de 68 anos, é o artista homenageado da 8ª Bienal do Mercosul, que começa em setembro. O italiano Giuseppe Penone abriu os preparativos da Documenta 13, de Kassel (Alemanha), que será realizada em 2012 – a mais importante mostra dedicada à vanguarda no mundo. Até o ano que vem, quem ganha pavilhão no centro de arte contemporânea mineiro é Lygia Pape (1927-2004), que, mesmo sendo do núcleo histórico do neoconcretismo, venceu em 2011 a grande exposição no Museu Reina Sofia (Espanha), depois do sucesso na Bienal de Veneza de 2010.
A coleção do Instituto Inhotim vem sendo formada há pouco menos de uma década. Tem cerca de 750 obras – cerca de 70 delas expostas. É dedicada a manifestações artísticas e autores que se firmaram a partir da segunda metade do século 20. “Nosso objetivo não é formar coleção enciclopédica, com exemplos da produção de cada artista, mas investir em conjunto representativo”, explica Rodrigo Moura, que divide a curadoria do museu com Jochem Voltz. “Aqui é possível encontrar obras importantes dos últimos 50 anos, o que cria a possibilidade de se olhar para o passado e o futuro ao mesmo tempo”, acrescenta. “A coleção conta história da arte brasileira e de Minas sem segregá-las”, afirma, lembrando que as obras internacionais permitem contextualização ampla.

Financiamento
A seleção de autores e obras é produto de rotina pesada, procurando acompanhar o que está sendo feito no mundo, em diversos casos dialogando diretamente com os artistas. Muitas vezes financiando projetos arrojados, de modo a reunir obras que não existem em nenhum outro museu. Nas negociações, a instituição se vale também de “capital simbólico”. Rodrigo explica: “Conquistamos padrão de excelência e credibilidade no que se refere ao trabalho com arte. A possibilidade de construir um local especialmente para abrigar uma obra, de financiar o projeto, inserindo-o em contexto significativo, interessa a todos os artistas”. Argumentos que, certamente, soam como melodia sedutora para os autores.
Em números

» Galerias
Em 2006 6
Em 2011 17

» Recorde mensal de público
Em julho de 2010 22.281
Em julho de 2011 31.799

» Área de visitação
Em 2006 40 hectares
Em 2011 102 hectares

» Espécies de plantas
Em 2006 2 mil
Em 2011 4,8 mil

» Visitação total por ano
2006 7.114
2007 105.747
2008 109.337
2009 147.942
2010 169.289
2011 22.949 – até março

» Gosto do público

42,9%
preferem as obras que estão ao ar livre

27,4%
preferem as que estão nas galerias

0,6%
não gostou de nenhuma obra

» Artistas de que o público mais gosta, pela ordem:


Cildo Meirelles, Doug Aitken e Adriana Varejão
Por Walter Sebastião, do Estado de Minas

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