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domingo, 20 de abril de 2014

Visões sobre o Brasil por meio da arte, no Museu de Arte Moderna de Nova York (MoMa).

É aguardada em maio a inauguração da mostra “Lygia Clark: O Abandono da Arte”, no Museu de Arte Moderna de Nova York (MoMa).

Artistas brasileiros ganham o mundo ampliando o campo de atuação além do cenário nacional




Mostra. “O que Sobrou da Corrida?”, de Jonathas de Andrade, foi levada aos EUA



Mosaico. No trabalho “Museu do Homem do Nordeste”, Jonathas de Andrade questiona a noção de identidade cultural brasileira












 Esta será a maior exposição que vai revisitar o legado da artista brasileira naquele país. Tratamento semelhante Hélio Oiticica (1937-1980) já recebeu em outros destinos, como em 2012, em Portugal, e no início deste ano na Alemanha. Nos dois lugares, as obras dele receberam uma atenção de amplitude até então inédita.

Consolidados como duas das principais referências das artes visuais aqui produzida, Clark (1920-1988) e Oiticica conquistam o mundo da mesma maneira que se tornam importantes vias de acesso a percepções sobre o Brasil até pouco tempo desconhecidas. Tal movimento reverbera ainda no presente a partir da projeção crescente de veteranos e novos artistas que em sua trajetória internacional contribuem para difundir e problematizar a multiplicidade que caracteriza o país.

Embora alguns possam ainda não ter alcançado o status consagrado desses dois nomes atrelados à vertente neoconcreta, eles atuam em um cenário que certamente oferece mais oportunidades, facilitando a sua penetração global, se comparado com o contexto de três décadas atrás. Essa virada, para curadores e críticos, acontece a partir de 1990, quando a internacionalização da produção artística brasileira dá seus primeiros passos.

De lá para cá, assiste-se, por exemplo, profissionais como Ernesto Neto, Beatriz Milhazes, Rivane Neuenschwander e Vik Muniz, entre outros, circularem no cenário externo de maneira não experimentada antes.

“Essa geração foi a primeira no Brasil a desfrutar de uma entrada no circuito internacional potente em vida. Outros não viveram isso. O reconhecimento de Hélio e Lygia, por exemplo, foi póstumo. Tunga, Waltercio Caldas, Cildo Meireles e tantos outros que iniciaram nos anos 1970, já tinham trajetórias maduras quando começaram a ser reconhecidos fora do país”, observa a professora, crítica de arte e curadora Luisa Duarte.

Ernesto Neto, que atualmente expõe suas esculturas no museu Guggenheim, em Bilbao, na Espanha, relaciona a essa abertura o modo como durante a década de 1990 a América Latina despertou o interesse da comunidade artística estrangeira. “O mundo, de repente, queria saber o que estava acontecendo aqui. Disso surgiram alguns frutos que foram irreversíveis. Ao mesmo tempo que há essa mudança de olhar, há uma valorização da arte contemporânea a partir daquele momento que faz parte de um fenômeno mais amplo, global, e não apenas relacionado ao Brasil”, diz Ernesto Neto.

Quebra. Diretor de arte e programação cultural do Instituto Inhotim, Rodrigo Moura afirma que dali em diante a arte latino-americana provoca uma recepção crítica menos superficial.

“Até meados da década de 1990, a arte latino-americana era vista pelo rótulo de fenômeno de nicho. Não apenas a produção artística brasileira vivia fora do cenário internacional, mas a de todos os outros países vizinhos. Isso só começou a ser questionado e quebrado nas últimas duas décadas”, sublinha Rodrigo Moura.

O distanciamento entre os centros e as periferias do universo da arte, desde então, vem se estreitando, o que tem permitido maior mobilidade para os artistas. Radicado em Londres desde o fim da década de 1990, Alexandre da Cunha, ressalta inclusive uma dinâmica de “desinternacionalização” da arte que se descortina ao seu ver atualmente.

“Como essas barreiras têm ficado mais tênues, existe menos essa noção de exterior. As pessoas hoje circulam mais, e aquelas que ficam ou saem do Brasil conseguem acompanhar o que acontece no mundo todo. De certa forma, o mercado internacional e nacional de arte vem caminhando para uma direção em que tudo parece ser um a coisa só”, reflete Alexandre da Cunha.

Isso não significa, para o artista, abrir mão de qualidades e referências capazes de conectar a cultura do seu lugar de origem diretamente aos seus trabalhos. Ele, no entanto, critica estratégias que insistem em agrupar diferentes artistas por meio de critérios geográficos ou de nacionalidade.

“Eu sou muito descrente de alguns tipos de curadoria que têm como tema ou gancho principal a questão da nacionalidade. Acho que há algumas abordagens que podem ser mais interessantes. Por exemplo, ainda dentro desse recorte latino-americano, relacionar artistas não só pela geografia mas pela maneira como eles lidam com materiais pertinentes a uma cultura, expressando uma determinada sensibilidade”, explica Cunha. “O mundo está ficando menor, não faz sentido pensar exclusivamente apenas pelo prisma do desenho de fronteiras”, diz.

Ocidental? Também com ressalvas a modelos curatoriais presos a visões nacionalistas, Ernesto Neto defende, por outro lado, que os artistas brasileiros podem ter algo diferente a mostrar ao mundo. “O brasileiro acha que é ocidental, mas lá fora ninguém acha muito isso da gente. Pensar isso é algo bastante libertador. Nós tivemos uma formação social muito distinta, com influências de matriz indígena e africana, além da europeia, e isso faz com que nós tenhamos um ‘modus operandi’ distinto dos outros”, ressalta Neto.

“Temos que aceitar nossas limitações e alegrias, ver o que temos de bom e ruim, entender as culturas indígenas e africanas, para marcamos nossa posição no mundo”, completa.

Aclamado entre os artistas mais jovens, o alagoano Jonathas de Andrade, radicado em Recife, atualmente expõe nos Estados Unidos, na Jordânia e no Peru. Suas criações, como o “Museu do Homem do Nordeste”, frequentemente questionam a ideia de identidade cultural. Para ele, em vez de defender uma síntese do que é ser brasileiro, lhe parece mais palpável espalhar a dúvida.



“Minha pesquisa que leva ao ‘Museu do Homem do Nordeste’ repensa na ideia de brasilidade por meio de uma série de trabalhos. Eu tomo essa ideia de uma identidade regional como uma metáfora para se pensar em questões de caráter mais universal. Hoje, os museus, como este a que me refiro nesse trabalho e que foi criado por Gilberto Freire, estão sendo revisados. Quando eu lanço esse olhar para minha própria cultura, ele poderia ser aplicado em qualquer outro lugar”.


fonte:
http://www.otempo.com.br/divers%C3%A3o/magazine/vis%C3%B5es-sobre-o-brasil-por-meio-da-arte-1.825990
CARLOS ANDREI SIQUARA

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